terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Ninguém me conhece...




Ninguém me conhece da maneira que você ousou.
Ninguém foi tão profundo,
E eu vou usar o mar como metáfora,
Um dos meus maiores medos,
E resistiu por tanto tempo.

O que me assusta
E não deveria
É que não estou dando um peso maior ao fato.
Ou organizando as palavras de forma meticulosa
Para parecer misterioso
Ou interessante.
Não.

De fato, ninguém sabe tanto sobre mim.
Do que não é visível.
Do que não se percebe ao observar
Da forma que você...
(Eu não sei completar essa frase)

Você conhece tudo o que não é agradável.
Você sabe quando estou agindo de forma educada
Somente para cumprir formalidades.
Sabe quando eu concordo querendo explodir palavrões.
Das ironias, dos segredos, dos armários.
Das insatisfações, receios e despudores.
Dos pecados, todos eles e os seus desdobramentos, você sabe.
Algumas vezes sorri para eles e me respeita
E que me ensina a ser.
Quase sempre.

Você sabe do que me desagrada.
Do que me incomoda.
Do que me paralisa e não sei se é comum
Alguém saber tanto do outro
Mesmo depois de tanto tempo.

Eu não sei se é natural alguém conhecer sobre tanto
Do que é sombra em outra pessoa.
Se for trivial se deixar radiografar sem garantias
Porque com gente é assim:
Sem garantias.

Gostaria de qualquer rede de segurança,
Qualquer direito que me protegesse
Mas se eu resolver listar tudo o que eu gostaria
Poderia escrever por três dias.
Meses, talvez.

Provavelmente, eu não sei tanto sobre você.
Não me aflige não saber.
Não saber, na verdade, me salva.
Não saber, de uma forma bem sarcástica, é minha garantia.
Não saber, só me faz tomar ciência de que sou o tipo de pessoa
Que se deixa decifrar facilmente
E não acredito que somos todos tão misteriosos assim.
Mas permitir é uma escolha
Assim como conviver, ser amigo, amar.

Se permito tão fácil e tão simples,
É também pela qualidade do tempo.
Do amor
Que me sopra que ninguém aproveitou tanto do agrado
Das luzes
Da gentileza
E das sopas de letrinhas da forma como você se lançou.
Tempo do amor, eu dizia.
Ou vaidade deslavada.

E você, homem lindo, já compreendeu.
Percebeu.
Retribuiu.
E se esquiva ou se esconde,
Ou talvez tenha medo,
A ponto de se deixar penetrar.

Do equilíbrio entre o sim e o não
É que talvez se explique o fato de que nós dois juntos
Consigamos nos preservar sem tantos espinhos.
Daquelas equações improváveis
Daqueles nós insolúveis
Daqueles casos descartados
Que se alimentam da improbabilidade
De perceber a beleza que sempre existiu
Mas nunca foi provocada.

Ninguém sabe tanto dos meus vulcões.
Ou suportou por tanto tempo todo tremor de terra.

Sei também eu das tuas e dos teus desvios
Conheço os atalhos
Sei da roupa amassada
Da fome gigantesca
De quando os holofotes descansam
E a maquiagem derrete
Da lágrima que ninguém viu, eu sequei cada uma.

Aqui vou me desdizer
E deixar de ser poeta:
É recíproco - sim - porque ambos compreendemos
Que é preciso alguém para dividir qualquer tesouro
Empoeirado ou não.

Companheiros, me sopra o racional
Se não fosse essa leve sensação de não se deixar tocar
De te exigir atitudes
Mendigar migalhas
Eu, com reserva para tantos invernos.
Me assalta a sensação de não satisfação
E que não chega a ser nada além de uma sensação
Tola
Que não esbarra na história real de nós dois.

Ninguém nunca me resistiu por tanto tempo.
Ao meu amor. Carinho. Ou qualquer outra urgência branda.
Ninguém foi tão meu amigo por tantas quadras
Me entregando a sensação de que cada dia é um novo dia.
Nova página para rabiscar

Ávidas crianças diante da tinta abundante e plural.
Ciente dos cuidados, da conquista que se refaz
Feito tecelão dos bons, diante da sua melhor roca.

Era sobre isso que eu queria escrever:
Sobre essa responsabilidade
de ser e estar
Que a gente vai honrando com sal pimenta
E um açúcar nada amargo.

Egídio La Pasta

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