segunda-feira, 14 de março de 2011

O Idiota




Ao ler o Livro “Céu e Fogo” de Mário de Sá-Carneiro , o autor começa o livro com um excerto do livro “ O Idiota” de Fiódor Dostoievsky :
“Qu’importe que ce soit une maladie, une tension anormale, si le resultat même, tel que, revenu à la santé, je me rapelle et l’analyse, renferme au plus haut degré l’harmonie et la beauté...

O “Idiota” foi um dos livros que mais me marcou, e por isso, logo me transportei no tempo, entrei dentro da história, e recordei com saudade este Príncipe Míchkin, que sofre de Epilepsia, tal como o próprio Dostoiévski, e que possui uma Alma Pura e Nobre, o que faz com que aos olhos dos outros, se pareça com um perfeito Idiota.
Este excerto do livro, situa-se numa altura em que ele chega da Suíça a S. Petersburgo, e em frente à montra de uma loja, ele põe em dúvida se realmente essa loja existe, ou se é uma alucinação sua, muito normal de acontecer, segundos antes de um ataque de Epilepsia. Então, entra em reflexão sobre a altura que antecede um ataque de epilepsia .
Esta é a sua reflexão:

“ Entre outras coisas, pensava que no seu estado epiléptico havia uma fase, quase imediatamente antes do ataque, em que, de repente, no meio da tristeza, das trevas espirituais, da pressão, o seu cérebro como que se incendiava por instantes, e todas as suas forças vitais ficavam tensas, num ímpeto extraordinário. A sensação de vida e de auto consciência, parecia duplicar-se nesses instantes, que tinham a duração de um raio. A mente e o coração iluminavam-se com uma luz inacreditável; todas as hesitações e preocupações dele pareciam apaziguar-se de todo, resolvidas num sossego superior, pleno de uma alegria e de uma esperança claras e harmoniosas, como que preenchido da razão e da causa ultima. Mas estes momentos, estes clarões, eram apenas o pressentimento daquele instante, daquele segundo final com que se iniciava o ataque propriamente dito. Este segundo era, evidentemente, insuportável. Ao reflectir mais tarde sobre esse instante, já num estado saudável, dizia muitas vezes para si mesmo:
Todos esses raios, esses clarões de plena sensação e consciência superiores e, por conseguinte, de uma “experiência superior”, mais não são do que a doença, a desordem do estado normal, e, sendo assim, não se trata de nenhuma existência superior mas, pelo contrário, deve ser atribuído à mais inferior das consciências inferiores.
Entretanto, acabou por chegar a uma conclusão extremamente paradoxal:
Que importância tem que seja uma doença? – decidiu. – Que importa que seja um estado de tensão anormal, se o resultado em si, se o instante de sensação recordado e analisado já num estado saudável, se apresenta como o grau superior da harmonia e da beleza, é um sentimento, nunca visto nem esperado, de plenitude, de medida, de apaziguamento e fusão extasiada e religiosa com a síntese superior da vida?
Estas formulas nebulosas pareciam-lhe bastante compreensíveis, embora com uma força de expressão bastante fraca. Uma coisa é certa: não duvidava, nem era possível duvidar, de que se tratava realmente de “beleza e oração”, que aquilo era realmente a “síntese superior da Vida”. É que acontecia mesmo, acontecia de facto, conseguir dizer a si mesmo, naquele segundo, que aquele segundo, pela felicidade infinita que lhe dava, e que ele sentia plenamente, poderia valer toda uma Vida”

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