sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Sistema

Pergunta – Mas o sistema é necessário para a sobrevivência de todas as pessoas, pois se todos resolvem burlar o sistema, a sociedade para e do que as pessoas viveriam?

Monge Genshô – Exato, mas onde está a grande questão? Eu tenho um nome, mas tenho que entender que ele apenas serve para que eu transite nesse sistema, é só uma fantasia, não uma realidade. Você possui um numero de CPF que lhe é útil para que você consiga uma série de coisas, mas deve entender que esse número não é você, é apenas uma fantasia criada dentro de uma instituição. Se você tiver a consciência clara de que é uma fantasia, poderá perdê-lo sem desejar se matar. A pessoa que se mata porque perdeu o crédito acreditou que ela fosse a fantasia, o nome ou o número. A pessoa pode usar o sistema e seus rótulos como algo útil, desde que não se confunda com eles. É como usar uma roupa, você não pode pensar que você é a roupa. Essa compreensão é muito importante.

Pergunta – Eu fico pensando nessa pessoa e se ela fez algo para que isso acontecesse realmente ou se foram as circunstâncias que o colocaram nessa situação. O problema de ser o caloteiro é quando a própria pessoa cria as condições de ser chamado de tal.

Monge Genshô – Essa é outra situação. Isso é usar de artifícios dentro do sistema para levar vantagens. Mas de qualquer forma esta pessoa também está presa ao sistema. O que eu quero é fazer com que vocês olhem para o sistema e seus rótulos como instrumentos para transitar no mundo, mas não se confundam com eles. Você não é o “eu”, pois nada tem um “eu” inerente, todos os “eus” são construídos e tudo que estamos falando sobre sistema faz parte das atribuições criadas pelo sistema. É funcional? Sim, mas é uma ilusão, não é a realidade e por isso não tem sentido, por qualquer coisa que aconteça dentro desse sistema, você se matar. A grande lição disso tudo é a existência de uma liberdade fundamental da qual você pode usufruir. Você pode usufruir de todo o sistema desde que não perca sua lucidez. O sistema é útil, mas não é a essência da vida. O dinheiro é útil? Sim, mas não somos o dinheiro.




Quando ouvimos, ou lemos, os ensinamentos budistas, ficamos confusos pois estamos acostumados a pensar de forma dual, sempre os extremos... mas depois, lembro-me que o budismo ensina o "caminho do meio".

Vivemos num sistema que foi historicamente construído a partir de um conjunto de ilusões para a manutenção do poder de certas pessoas...
Marx concluiu que os conflitos sociais se dão a partir do conflito de classes (a tentativa de uma determinada classe dominar a outra) mas, ao ler sobre o budismo, posso concluir que não é bem esse o caso.
O problema é que a consciência de classe confere uma identidade ao indivíduo que se agarra a essa ilusão gerando conflito.
O sistema é criado para a manutenção do poder e para isso ele precisa da ilusão do "eu".
Esse eu, que acredita que para que essa sua breve existência tenha algum sentido, ela precisa ser reconhecida, e para tanto precisa de posses... essas posses representarão os seus feitos passados e isso definirá quem ele é, dando-lhe um referencial para continuar sendo... mas isso tudo gera muito sofrimento.

É carregar o peso da ilusão de um mundo... tu estarás o tempo todo a cobrares-te por algo que não faz o menor sentido.

Por isso acredito que o caminho do Zen Budismo é bom...
Não fosse o sistema, nós não teríamos inventado tantas coisas que facilitam e melhoram a nossa qualidade de vida, porém... o impulso que gerou e mantém o budismo, a compaixão, é muito mais forte e poderoso do que a competição do ego que mantém esse sistema.
A vontade de livrar as pessoas do sofrimento manifestada por Siddhartha é um impulso que iniciou a cerca de 2500 anos e vem até hoje mantendo o budismo, e ela poderia perfeitamente substituir a competição do ego sem prejudicar o desenvolvimento tecnológico e intelectual da humanidade.

Viver no sistema e direccionar as pessoas para a iluminação pode parecer paradoxal, mas eu lembro que os extremos frequentemente fazem parte de uma ilusão, e que sempre há o caminho do meio.

Negar o sistema é negar o mundo, mesmo que ilusório, e isso é contraditório, pois nossas ilusões fazem parte de nossa realidade.
Esse é um verdadeiro dilema.
Nessa realidade certas ilusões são necessárias para que possamos interagir... o que podemos e devemos fazer é, tentar ver para além dessas ilusões e assim nos tornarmos seres conscientes e livres, agindo de forma justa e correta...

Não há como simplesmente eliminar o ego e as ilusões, ilusões são ilusões e elas estão ali... Mas não há porque se prender a esses conceitos, como se eles fossem uma realidade absoluta e estática.
Simplesmente negar algo que está ali é um extremismo, não condiz com o caminho do meio... Devemos tentar ver para além da dualidade.
O que é uma tarefa árdua...e por isso não sou praticante do Budismo...

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