sábado, 3 de maio de 2014

BIBA O NORTE, CARAGO!!!!!!!!!!!!!!!!!


Tenho de partilhar aqui com quem queira ler esta crónica do Miguel Esteves Cardoso.
Finalmente um lisboeta que entende o que um nortenho sente.
Não é sentimento de superioridade, nem de ser melhor que os outros...é simplesmente SENTIR!
Quando se vai viver para o Sul, é que se sente a diferença...e custa tanto!
No Sul há uma competição, uma necessidade de mostrar quem é melhor.
No Norte, isso não acontece...Somos todos UM!
E isso sabe tão bem!

Já agora, um exemplo que senti quando fui viver para o Sul.
No norte quando nos batem à porta, costumamos dizer:
- Entra... Quem é?

No sul dizem:
- Quem é? (...) Entra

Então aqui fica a crónica "Norte"

"Primeiro, as verdades.
O Norte é mais Português que Portugal.
As minhotas são as raparigas mais bonitas do País.
O Minho é a nossa província mais estragada e continua a ser a mais bela.
As festas da Nossa Senhora da Agonia são as maiores e mais impressionantes que já se viram. Viana do Castelo é uma cidade clara.
Não esconde nada.
Não há uma Viana secreta.
Não há outra Viana do lado de lá.
Em Viana do Castelo está tudo à vista.
A luz mostra tudo o que há para ver.
É uma cidade verde-branca.
Verde-rio e verde-mar, mas branca. Em Agosto até o verde mais escuro, que se vê nas árvores antigas do Monte de Santa Luzia, parece tornar-se branco ao olhar. Até o granito das casas.
Mais verdades.
No Norte a comida é melhor.
O vinho é melhor.
O serviço é melhor.
Os preços são mais baixos.
Não é difícil entrar ao calhas numa taberna, comer muito bem e pagar uma ninharia.
Estas são as verdades do Norte de Portugal.

Mas há uma verdade maior.
É que só o Norte existe.
O Sul não existe.
As partes mais bonitas de Portugal, o Alentejo, os Açores, a Madeira, Lisboa, et caetera, existem sozinhas.
O Sul é solto.
Não se junta.
Não se diz que se é do Sul como se diz que se é do Norte.
No Norte dizem-se e orgulham-se de se dizer nortenhos.

Quem é que se identifica como sulista?
No Norte, as pessoas falam mais no Norte do que todos os portugueses juntos falam de Portugal inteiro.
Os nortenhos não falam do Norte como se o Norte fosse um segundo país.
Não haja enganos.
Não falam do Norte para separá-lo de Portugal.
Falam do Norte apenas para separá-lo do resto de Portugal.
Para um nortenho, há o Norte e há o Resto.
É a soma de um e de outro que constitui Portugal.
Mas o Norte é onde Portugal começa.
Depois do Norte, Portugal limita-se a continuar, a correr por ali abaixo.
Deus nos livre, mas se se perdesse o resto do país e só ficasse o Norte, Portugal continuaria a existir. Como país inteiro.
Pátria mesmo, por muito pequenina. No Norte.

Em contrapartida, sem o Norte, Portugal seria uma mera região da Europa.
Mais ou menos peninsular, ou insular.
É esta a verdade.

Lisboa é bonita e estranha mas é apenas uma cidade.
O Alentejo é especial mas ibérico, a Madeira é encantadora mas inglesa e os Açores são um caso à parte.
Em qualquer caso, os lisboetas não falam nem no Centro nem no Sul - falam em Lisboa.
Os alentejanos nem sequer falam do Algarve - falam do Alentejo.
As ilhas falam em si mesmas e naquela entidade incompreensível a que chamam, qual hipermercado de mil misturadas, Continente.

No Norte, Portugal tira de si a sua ideia e ganha corpo.
Está muito estragado, mas é um estragado português, semi-arrependido, como quem não quer a coisa.
O Norte cheira a dinheiro e a alecrim.
O asseio não é asséptico - cheira a cunhas, a conhecimentos e a arranjinho.
Tem esse defeito e essa verdade.
Em contrapartida, a conservação fantástica de (algum) Alentejo é impecável, porque os alentejanos são mais frios e conservadores (menos portugueses) nessas coisas.
O Norte é feminino.
O Minho é uma menina.
Tem a doçura agreste, a timidez insolente da mulher portuguesa.
Como um brinco doirado que luz numa orelha pequenina, o Norte dá nas vistas sem se dar por isso.

As raparigas do Norte têm belezas perigosas, olhos verdes-impossíveis, daqueles em que os versos, desde o dia em que nascem, se põem a escrever-se sozinhos.
Têm o ar de quem pertence a si própria.
Andam de mãos nas ancas.
Olham de frente.
Pensam em tudo e dizem tudo o que pensam.
Confiam, mas não dão confiança.
Olho para as raparigas do meu país e acho-as bonitas e honradas, graciosas sem estarem para brincadeiras, bonitas sem serem belas, erguidas pelo nariz, seguras pelo queixo, aprumadas, mas sem vaidade.
Acho-as verdadeiras.
Acredito nelas.
Gosto da vergonha delas, da maneira como coram quando se lhes fala e da maneira como podem puxar de um estalo ou de uma panela, quando se lhes falta ao respeito.
Gosto das pequeninas, com o cabelo puxado atrás das orelhas, e das velhas, de carrapito perfeito, que têm os olhos endurecidos de quem passou a vida a cuidar dos outros.
Gosto dos brincos, dos sapatos, das saias.
Gosto das burguesas, vestidas à maneira, de braço enlaçado nos homens.
Fazem-me todas medo, na maneira calada como conduzem as cerimónias e os maridos, mas gosto delas. São mulheres que possuem; são mulheres que pertencem.
As mulheres do Norte deveriam mandar neste país.
Têm o ar de que sabem o que estão a fazer.

Em Viana, durante as festas, são as senhoras em toda a parte.
Numa procissão, numa barraca de feira, numa taberna, são elas que decidem silenciosamente. Trabalham três vezes mais que os homens e não lhes dão importância especial.
Só descomposturas, e mimos, e carinhos.
O Norte é a nossa verdade.

Ao princípio irritava-me que todos os nortenhos tivessem tanto orgulho no Norte, porque me parecia que o orgulho era aleatório.
Gostavam do Norte só porque eram do Norte.
Assim também eu.
Ansiava por encontrar um nortenho que preferisse Coimbra ou o Algarve, da maneira que eu, lisboeta, prefiro o Norte.
Afinal, Portugal é um caso muito sério e compete a cada português escolher, de cabeça fria e coração quente, os seus pedaços e pormenores.
Depois percebi.
Os nortenhos, antes de nascer, já escolheram.
Já nascem escolhidos.
Não escolhem a terra onde nascem, seja Ponte de Lima ou Amarante, e apesar de as defenderem acerrimamente, põem acima dessas terras a terra maior que é o "O Norte".

Defendem o "Norte" em Portugal como os Portugueses haviam de defender Portugal no mundo.
Este sacrifício colectivo, em que cada um adia a sua pertença particular - o nome da sua terrinha - para poder pertencer a uma terra maior, é comovente.
No Porto, dizem que as pessoas de Viana são melhores do que as do Porto.
Em Viana, dizem que as festas de Viana não são tão autênticas como as de Ponte de Lima.
Em Ponte de Lima dizem que a vila de Amarante ainda é mais bonita.
O Norte não tem nome próprio.
Se o tem não o diz.
Quem sabe se é mais Minho ou Trás-os-Montes, se é litoral ou interior, português ou galego? Parece vago.
Mas não é.
Basta olhar para aquelas caras e para aquelas casas, para as árvores, para os muros, ouvir aquelas vozes, sentir aquelas mãos em cima de nós, com a terra a tremer de tanto tambor e o céu em fogo, para adivinhar.
O nome do Norte é Portugal.
Portugal, como nome de terra, como nome de nós todos, é um nome do Norte.
Não é só o nome do Porto.
É a maneira que têm de dizer "Portugal" e "Portugueses".
No Norte dizem-no a toda a hora, com a maior das naturalidades.
Sem complexos e sem patrioteirismos.
Como se fosse só um nome.
Como "Norte".
Como se fosse assim que chamassem uns pelos outros.
Porque é que não é assim que nos chamamos todos?"

Miguel Esteves Cardoso



A Região Norte é uma região, ou unidade territorial para fins estatísticos de nível II (NUTS II), de Portugal, que compreende os distritos de: 
Viana do Castelo,
Braga,
Porto,
Vila Real e
Bragança,
e parte dos distritos de
Aveiro,
Viseu e
Guarda.

Limita a norte e a leste com Espanha (Galiza e Castela e Leão, nomeadamente), a sul com a Região Centro, e a oeste com o Oceano Atlântico.
Tem uma área de 21 278 km² (24% do Continente) e uma população de 3 689 682 habitantes (Censos de 2011), correspondendo a 37% do Continente e a 35% de Portugal.
Compreende 8 sub-regiões ou unidades de nível III (NUTS III):

Alto Trás-os-Montes
Ave
Cávado
Douro
Entre Douro e Vouga
Grande Porto
Minho-Lima
Tâmega

A Região do Norte compreende 86 concelhos (27,8% do total nacional).

O Norte. É assim que os nortenhos falam da sua região.
Sem preconceitos ou vergonhas, mas com aquela garra de quem sente orgulho por uma cultura, por uma tradição.
Não querem cá saber se melhores ou piores, porque o que interessa é a sua alma, o seu emblema. Não vivem para as estatísticas porque só conhecem uma: a sua própria estatística.

Ninguém nasce no Porto, em Amarante, em Ponte de Lima ou em Viana.
Não.
As pessoas nascem no Norte.
Apenas e só no Norte, não nascem em mais lugar nenhum seja uma vila ou concelho.

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