sábado, 13 de dezembro de 2014

..............é noite e as noites custam, a mim custam



Fica comigo.
Daqui a nada é noite e as noites custam, a mim custam, sobretudo quando os candeeiros da rua se acendem e as árvores e os prédios fronteiros logo diferentes, quase ninguém na rua, um miúdo com um cão lá ao fundo, uma tristeza parada na tonalidade do silêncio, estes móveis e estes retratos que não me ligam nenhuma, os teus passos na escada, tu no passeio: nem vou à janela olhar, não quero olhar.
Fica comigo só mais um bocadinho, dez minutos, meia hora, sei lá, o tempo inteiro.
Mesmo que não fales.
Mesmo que leias a revista do jornal.
Mesmo que não me toques.
Mesmo como se eu não existisse.
Há alturas, imagina, em que penso que não existo e depois vem a aflição, o medo, o meu pulso tão rápido, a voz da minha mãe, do fundo da infância.


António Lobo Antunes

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