segunda-feira, 13 de julho de 2015

Compaixão



Foto: Nancy Borowick 
Após descobrir que seus pais foram diagnosticados com cancro, 
registou durante um ano as imagens 
de amor, fragilidade, compaixão e companheirismo ente os dois.




Sei que há uma grande diferença entre conhecer o caminho e trilhar o caminho.
E temos todos um longo caminho pela frente até que possamos manifestar verdadeira e continuamente a compaixão em nossas vidas.

O sofrimento e a dor são naturais, todos vivemos isso: uma hora é a morte de alguém, outra hora é a doença do outro, a dificuldade de superarmos limitações... e assim segue a vida. A compaixão é quando captamos a dor do outro e por meio dela ficamos unidos a todos. Apenas assim podemos contribuir para a libertação e o crescimento de todos nós.

Compaixão é quando podemos ver ou sentir a natureza humana de uma pessoa se manifestando e aproveitarmos a oportunidade para procurar ajudar, para transformar sombras em luz. Por meio de conversas e terapias, ou muitas vezes até pela correção mais direta e firme. Mas se tivermos raiva, rejeição, julgamento ou impaciência diante da natureza humana, a cura não acontece. Neste nível de envolvimento pessoal não é possível ajudar o outro. Só podemos interferir na natureza humana de alguém quando acolhemos essa natureza em nós mesmos, sem julgar ou condenar, com compaixão e impessoalidade, sabendo que a sua natureza humana é também a nossa. Ao superarmos em nós, podemos corrigir.



COMPAIXÃO NÃO É PENA
A atitude do ego de sentir "dó" não é compaixão. Não adianta analisar a fome de um país, assistir a noticiários e ter pena dos miseráveis, achando que compaixão é apenas condenar o governo e partilhar mensagens de revolta na internet. Alimentar os que passam fome tem seu valor, mas o que dermos materialmente dura apenas um ou dois dias. É apenas a nossa iluminação, a nossa libertação que traz a verdadeira felicidade para o mundo, pois estamos todos conectados. A compaixão é como um alimento que não se esgota e que se irradia para todos.

É a aceitação dos outros como eles são. Temos que deixar cada um carregar sua cruz, caso contrário não carregamos nem a nossa, nem a do outro. Primeiro temos que ter compaixão por nós mesmos, para então poder auxiliar o outro.

Por exemplo: em relação aos filhos ou aos familiares, temos que aprender a aceitá-los da forma como eles são, porque não existe perfeição nesse mundo. Ninguém é perfeito e por isso não podemos julgar. Julgar é condenar. Ter compaixão é libertar. A verdadeira compaixão é abrir o coração para tudo e para todos, deixar o espírito fazer o que só Ele sabe fazer.

Somos todos produto do inconsciente coletivo e por isso não podemos jogar a primeira pedra. Toda a humanidade está em nós. Todos já fomos vítimas e algozes em nossas sucessivas encarnações. Alguns trazem certos aspectos a mais ou a menos do que os outros, mas tudo está em nós. Também não podemos esconder nossa humanidade debaixo do tapete pra manter as aparências, pois se não aceitarmos ser o que somos, quem vai comandar é o ego.


OUVIR O OUTRO
A mente surda é aquela que fica conjecturando sobre si mesma enquanto o outro está falando. Essa atitude mental faz com que não fiquemos abertos para aquilo que o outro fala. Isso é um vício. Rejeitar e não ouvir o outro é não sentir o que ele é. Muitas vezes fazemos isso porque desejamos que o outro seja o que nós queremos.

Ouvir o outro é sentir o que ele é verdadeiramente. É não rejeitar sua forma de estar no mundo. O outro precisa da nossa compaixão! Se não ouvirmos o que o outro fala de coração aberto, como seremos tocados por aquilo que o outro é? Como desenvolver a compaixão? Devemos ouvir não só para entender o que o outro está falando, mas para podermos nos relacionar verdadeiramente com o universo da natureza humana.


A LINGUAGEM UNIVERSAL
Falamos a linguagem universal quando nos abrimos para receber e entender tudo o que os outros nos dizem, além da nossa própria verdade. Quando respeitamos e compreendemos o ponto de vista de cada um, porque sabemos que as diferentes verdades conduzem para a Verdade Universal.

O mundo do ego ordena: você tem que ter personalidade, opinião! Mas os grandes Mestres ensinam: você tem que perder a personalidade, dissolvê-la. Se somos donos da nossa suposta verdade, da verdade de nossa mente condicionada, estamos aprisionados. Mas se não temos mais a nossa própria verdade, podemos viver todas. A Verdade Universal se dissolve nas diversas verdades e vice-versa.


CURAR COM A COMPAIXÃO
Curamos com a compaixão quando conseguimos enxergar a Luz, a Essência Divina contida em cada pessoa. Olhar seus dons, suas qualidades, seu potencial. Quando vier o vício de olhar as sombras é preciso mudar o enfoque, respeitando o momento na evolução, no crescimento daquela pessoa. O curador consegue ver o bom e o belo, de Ser para Ser.

Mas só temos o poder de curar quando não temos mais o desejo de mudar o outro, porque quem tem esse desejo é o ego. E o ego não tem poder nem autoridade para isso, pois o livre-arbítrio é nosso direito mais sagrado. Ao nos envolvermos emocionalmente com situações que não podemos resolver, estamos apenas demonstrando nossa infantilidade.

Precisamos aprender a colocar as coisas em seu devido lugar. Quando alguém está passando por uma dificuldade, é ele que está passando, e não nós. Temos que aceitar que essa é a história dele, o seu carma. A mãe, por exemplo, pode estar dormindo com o filho e se o filho tiver um pesadelo, ela não poderá ajudá-lo. É ele que tem que despertar.

Nem imaginar o que o outro está sentindo nós podemos, pois é o momento dele viver o que precisa viver e apenas quem vive sabe realmente o que se passa dentro de si. Não temos que sofrer só porque todo mundo sofre. Como auxiliar o outro se ficamos fragilizados como ele? Sim, é preciso ser sensível e reconhecer a dor do outro, mas devemos ser o que somos, mantendo-nos autênticos em nossa individualidade.


REFLETIR COMO O DIAMANTE
A compaixão acontece quando somos movimentados pelo outro. Recebemos o que vem da pessoa e passamos a compreender o que está dentro dela, mas sem nos perder de nós mesmos, do nosso centro e do nosso ser. Para isso temos que estar libertos do ego, da persona. É preciso estar vazio para poder sentir o outro.

No estado do ego queremos salvar as pessoas e este desejo gera uma tensão, uma simbiose que nos liga doentiamente a elas.
Mas num estado mais ampliado, no espírito, somos como o diamante, que reflecte todas cores e não tem cor.


TERRA FÉRTIL
Fértil é a pessoa natural e espontânea, que não tem medo de nada, que não teme ser aquilo que é. Temos que nos abrir para dar e não ficar esperando que o outro dê. Temos que ser flexíveis, que ser humanos iguais a todos, sem nos sentirmos especiais.
A terra fértil recebe todas as sementes, sem escolher nem um, nem outro.

Fértil é a pessoa aberta para doar, assim como a Mãe Terra doa seus frutos. Não é preciso medo, nem dúvidas de que podemos doar um sorriso, uma flor, uma música, uma ideia, uma intuição, um olhar.

Para conquistar a consciência do todo, nossa tarefa é conquistar a consciência de nós mesmos. E se não fizermos primeiro por nós, não poderemos verdadeiramente fazer nada por ninguém. Se formos felizes, faremos os outros felizes. Se formos equilibrados, podemos equilibrar todo o ambiente em que chegamos. Se tivermos compaixão por nós, poderemos ter por todos. Se nos amarmos, podemos amar o próximo. Se libertarmos a nós mesmos, poderemos libertar a todos.

Portanto, cuidar da nossa própria história, buscar o nosso próprio despertar, é o verdadeiro caminho da compaixão.


Marcelo Dalla


Já aqui tinha publicado outros textos sobre a Compaixão...um assunto que me toca especialmente.
Ao ler este texto, senti que até ao início deste ano, tenho errado com a minha mãe.
Altura em que tomei consciência disto, ao ler um texto da Ruth Fairfield que publiquei aqui.
Sempre vi a minha mãe em constante sofrimento psicológico, desde que me lembro de ser gente, com sucessivas depressões ao longo da sua vida.
E sempre quis curar as feridas dela, por ela.
Sempre sofri do Síndrome de Enfermeira com ela. Mas o curioso é que foi só com ela.
Hoje entendo que, queria curar as feridas dela, para poder viver uma relação positiva com ela, de mãe e filha.
Como estava enganada!! Só provoquei ainda mais tensão e conflito entre nós as duas...
Desde o início do ano que mudei a minha postura com ela, e a minha maior preocupação ao longo de 2015 tem sido curar as minhas próprias feridas, abraçar a minha criança interior sem culpas e sem culpar ninguém. Só assim serei verdadeiramente livre!!!
Quanto à minha mãe, tenho de a aceitar tal e qual como é, e ter a consciência de que tem de ser ela a trilhar o seu Caminho, a curar as suas feridas, o seu Karma, que não é o meu...
Que difícil que está a ser...por ser com a minha mãe...mas tenho de encarar!

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