domingo, 5 de março de 2017

Suicídio





É curioso pensar que em uma sociedade que enaltece o desenvolvimento tecno-científico e todas as múltiplas possibilidades existentes hoje, encontremos uma taxa tão alta de suicídio e, consequentemente, de descontentamento com a vida. O que me parece é que existem cabos demais ligando máquinas e desligando o homem e isso não é um problema próprio da tecnologia, e sim, da maneira como ela tem sido utilizada. Esse esfarelamento do conceito de humanidade tem afastado as pessoas e criado ilhas afetivas, vivendo isoladas. O senso de comunidade, dessa forma, também é desfeito e o sujeito sente-se completamente desolado em um mundo sem a presença de outras pessoas capazes de compreendê-lo e ajudá-lo, ou melhor dizendo, dispostas a, de fato, fazer isso.

Mesmo em um estado de solidão profunda e permanente, há ainda toda uma pressão social que obriga o sujeito a aparentar uma condição que não reflete a realidade interior. É a “famosa” ditadura da felicidade, que cria não só normas de conduta que conduzem invariavelmente qualquer um ao “sucesso” e à “felicidade”, mas também pune severamente todos aqueles que ousam se guiar por outro caminho ou demonstrar qualquer sinal de dor e fraqueza.

O resultado de todo esse aparato ditatorial é, de um lado, a supressão dos desejos, sonhos e ideais presentes nas pessoas, sobretudo, dos jovens (no qual a taxa de suicídio, “curiosamente” é maior, só para relembrar), tornando estes estranhos de si mesmos e infelizes em suas escolhas pessoais e profissionais, vivendo rotinas degradantes e meramente robóticas, sem nenhum sinal de alegria.

Na outra via, encontramos o surgimento e desenvolvimento de várias doenças sorrateiras e silenciosas, como a depressão e a ansiedade. Elas chegam de mansinho e quando percebemos, ela já tomou conta de cada célula do nosso corpo. Entretanto, por mais que o indivíduo esteja sofrendo, não há espaço próprio para que ele possa colocar para fora toda a sua dor. Aliás, como disse, é proibido demonstrar fraqueza, dor, sofrimento. E, então, o que acontece? A doença vai crescendo, mas de modo abafado, para que ninguém perceba, afinal, ninguém quer ser chamado de “fresco” ou “fraco”. O “Admirável Mundo Novo” só aceita pessoas “felizes”.

Diante desse turbilhão interno e de um mundo que não apresenta capacidade empática para lidar com o problema, muitas pessoas acabam sucumbindo e chegam ao suicídio. Se considerássemos, ainda, todas as pessoas que passando pelos problemas supracitados pensaram em algum momento em se matar, a nossa consternação seria ainda maior.

No entanto, apesar disso, continua sendo proibido ou “feio” falar em suicídio, ora porque se matar é pecado, ora porque é sinal de fraqueza, ora pelas duas coisas. E, assim, pessoas continuam morrendo e junto com elas: sonhos, desejos e alegrias irrealizadas. É preciso quebrar esse tabu, que mais do que “pecado” e “fraqueza” esconde todas as contradições de uma sociedade hipócrita, fria e mesquinha que é incapaz de olhar outro ser humano com alguma dose de humanidade. Mas o que esperar de uma sociedade que prefere ter robôs com sorrisos programados em público e humanos com lágrimas no quarto?

Enquanto não entendermos que ser humano também é poder demonstrar fraqueza e saber que haverá do outro lado alguém com a sensibilidade necessária para buscar compreender o que está acontecendo e, por conseguinte, ajudar a diminuir a pressão de uma panela prestes a explodir, infelizmente, esses dados se perpetuarão de maneira cada vez mais triste.

No fim das contas, o que alguém com pensamento suicida precisa é de um olhar demasiadamente humano de carinho e empatia, que seja capaz de fazê-lo enxergar o divino presente em cada detalhe pequeno e maravilhoso da vida.


Erick Morais



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